10 de ago. de 2014

NINGUÉM TEM QUE SER MORTO POR SER DIFERENTE ou "O QUARTETO de LESBICAS NO ESTILO DISNEY WORLD"

Como estamos no mês comemorativo da Visibilidade Lésbica, queria começar esse texto falando sobre a  recém-falecida novela “Em Família” com o seu quase fantástico quarteto do gênero Clarina / Flanessa> Acontece que assisti o filme  holandês  “Um Grito de Socorro” (Spijt!)  de 2013, sobre um menino gordinho que sofria  bullying todos os dias na escola. 
E o que tem uma coisa a ver com a outra? 
O filme também destaca a (falta) de atitude das pessoas que cercavam o gordinho, pessoas que, no meu modo de ver, não enxergam a vítima para que não exista um algoz. Gente sentada na zona de conforto concedida pela sociedade como prêmio para aqueles que se adaptam à hipocrisia de uma (a)normalidade institucionalizada. Amarrados aos valores trabalhosos demais para serem revistos, "impossíveis de mudar" por ser o certo, por estarem sedimentados. Gente exercendo a mais consistente passividade. Afinal, violência e segregação não tem nada de normal!
Se o bullying começa travestido de brincadeiras e piadas, é a “vista grossa” que veste  os abusos  sofridos e sufoca  sua vítima no saco da invisibilidade, protegendo os agressores/ criminosos,  podendo elevar  as “brincadeiras” = ações odiosas  à potência de crimes de ódio. E, um crime não é crime apenas quando leva sua vítima à morte ou provoca lesões físicas.                                                                                            Crime é um ato que  infringe as leis e agride direitos, como por exemplo,  o tão badalado direito de  ir vir, o direito de manifestar opiniões, o direito de protestar contra contextos  injustos.
 Tanto o bulying (brincadeira que ridiculariza e subjuga um ser humano por questões que na maioria das vezes ele não tem ingerência) quanto o crime propriamente dito,  tem como consequência aleijar  pessoas psíquica e emocionalmente.  
Ambos (bullying e crime) mudam trajetórias de vidas, incapacitando pessoas para o exercício das suas possibilidades, sonhos, aspirações, habilidades, capacidades, competências
A atitude das pessoas ao redor  define a visibilidade ou não dos massacres que acontecem rotineiramente contra muitos segmentos, mas para alguns desses há a preocupação de buscar-se culpados e gerar estatísticas, como  aquelas  relativas à violência que vemos com mais frequência nos noticiários. 
No entanto, se o crime envolve gênero, passa a ser visto com condescendência, tirando da lista de seres humanos e cidadãos a vítima, uma vez que as leis existem para proteger o cidadão e todos são iguais perante a lei...
Em 2012, o “Disque 100”, serviço de denúncia telefônica da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, registrou 6.809 casos de violação dos direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBT). 
Em 2013 o número de mulheres assassinadas por serem homossexuais foi quase cinco vezes maior que a média de assassinatos dos últimos 20 anos.

Pois é, o Brasil, não ganhou a Copa,  mas é campeão mundial em assassinatos por homofobia. 

É o sétimo colocado em assassinato de mulheres e concentra 44% das mortes por homofobia praticadas em todo o mundo e, mais: 
Em quatro anos os casos de estupro cresceram 157% por aqui. Um vexame bem maior que perder de 7x1 para a Alemanha... O poder público, “não produz estudos aprofundados, evitando trazer à luz o nível de violência sofrido pelas mulheres e LGBTs”, subestima esses dados dando sua contribuição para a invisibilidade lésbica.

Falando de minorias, lésbicas, crimes e novela, “Em Família”, criticada do início ao fim, pelo público em geral, penso no comentário do diretor Daniel Filho referindo-se à reação do público diante de antigas produções  que abordaram os  temas  do negro  e relacionamentos  interraciais: “O público recebia melhor quando a dramatização  era apresentada dessa forma”. 
 “Essa forma” era ator branco pintado de preto (Sérgio Cardoso na “Cabana do Pai Tomás), casais interraciais já estabelecidos desde o início da produção (Milton Gonçalves e Suzana Faíni em “Irmãos Coragem”). 
Logo, compreensível  o quarteto de lésbicas no estilo  Disney World, apresentado na novela do Manoel Carlos, um pacote bem embrulhado com tudo o que a sensibilidade da nossa sociedade pode aguentar, modelos que possam ser questionados, invalidados ou mesmo corrigidos.
E por falar em “corrigidos”, Os “estupros corretivos” vêm aumentando. Um absurdo baseado na idéia que “homossexualidade feminina pode ser “curada” pelo estupro", ameaçando a vida de milhares de lésbicas. 
Um crime disfarçado de pensamento,  um  filhote diabólico do machismo com a homofobia.  Esse tipo de pensamento opressor, que subjuga a mulher em sua sexualidade é o que se chama de “invisibilidade lésbica” que dá a noção da carga múltipla de invisibilidade suportada pelas mulheres homossexuais, já que num país machista como o nosso, todas as mulheres são invisíveis, apenas porque são mulheres. No máximo avistam uma bunda aqui, um peito ali....

A importância de ser visível pode ser observada num fato acontecido no meio do ano passado, 2013, quando o deputado federal  Marcos Feliciano  aprovou a “Cura Gay” na Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados e milhares de pessoas nas redes sociais e nas ruas protestaram com o “Fora Feliciano” conseguindo com o clamor popular a retirada do projeto. 

Portanto, entrar no armário não é solução para invisibilidade lésbica, mostrem-se meninas, o Brasil precisa mostrar sua verdadeira cara, educar seus ignorantes e punir os verdadeiros bandidos! Ninguém tem que ser morto ou humilhado por  ser diferente.

Fonte das estatística citadas: www.pstu.org.br

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